quinta-feira, 31 de maio de 2018

VOS DIGO

A corda é bamba.
É bamba o equilibrista.
Do bamba ninguém afana,
só afana do turista. 

Do que veio ver
a igreja futurista.
Do que já veio velho
(mais esperto é o vigarista!)

Minha fé não tem campânulas.
Não tem genuflexório.
Não tem sinos.
Minha fé não tem sina.

(Dá-me fé que te ensino!)

Estou aqui mesmo para isso,
transmitir o transmitido.
Sou o que se chama torre,
mas ignoro abalo sísmico. 

Na Terra me sustento.
Dela vim e a ela tornarei.
Quanto ao que a sucede
prometo que me informarei.

(que me formarei,
melhorarei).

Minha fé não tem nave.
Não tem turíbulo.
Minha fé é ave,
desconhece cubículos.

O Sol da essência.
A Lua do espírito.
Vou-me ao céu,
vem-me o céu ao juízo.

Com menos cruzes,
menos material.
Já não sei se sou celeste
ou se sou espacial

quarta-feira, 30 de maio de 2018

ONDIPLENO

Para Isadora Liberato

A vela não faz nada sem o barco.
O barco sem fundo é naufrágio.
No fundo, à nau frágil 
não pode beijá-la a onda.
A onda que não morre na praia não se completa.
A praia que despede o mar 
não sabe do que está repleta.

Quem se completa prescinde da busca.
Eu sem amor sou renúncia.
A renúncia só me vale se por ele se faz.
(Não existe voltar ou atrás.)

Tomo coragem e o impulso.
Não sou intruso em meu peito!
No meu peito (poucos sabem!)
bate o plano perfeito!

terça-feira, 29 de maio de 2018

HIC ET NUNC (Alta. Nina II.)

Para Nina, Carol e Diogo. Para nós.


Maio,
antes ainda de junho.
Não foi preciso mais tempo pro apuro,
para apurar que já estava pronta.
Pronta pro mundo e pra nos juntar.

Toda a família,
coroa de olhos sobre o berço.
Vê-se nas caras de todos
o que é um fulgurante começo.

A primeira da mãe.
A primeira do pai.
Primeira do avô
e destes tios todos.

(Daqui se entende o alvoroço!)

Deus quando abençoa 
chove dádivas numa gota.
Sabia-o a que estava grávida,
sabe-o a gente toda.

Pouco comprimento.
Pouco peso.
Muito sentimento
(e eu tudo teço!).

Ponho no verso
esta linha de história.
(O padrinho é o justo
portador da memória!).

A terceira, a quarta voz,
para insistir, num cântico,
no que nos ultrapassa a nós.

Nina não perde na espera,
como não perdeu na que se cumpriu.
Não te falta um padrinho que ateste
que o tempo certo é o em que nos surgiu.

DILETO

Astronomia
Astrologia
Arquitetura
Física

Música
Equações químicas
no meu corpo e no seu.
A Matemática é dialeto de Deus.

domingo, 27 de maio de 2018

COGITO DANTES

Ergo o ego e o lanço fora,
e cogito o que fazer do resto.
Se o vazio me apavora
não foi caso de sucesso.

Tudo para cujo mantimento 
é necessária aprovação
é coisa de fora do sujeito.
(E sendo coisa é ilusão!)

Estimo saber a verdade
do quanto me vai dentro.
Sei que se acho a chave
sou meu próprio sustento.

Amor? O quanto possa!
Na aprovação reside o mal.
Esqueça o aplauso e a troça,
você é seu próprio ancestral!

sábado, 26 de maio de 2018

ARROJADA

Para Beatrice Mantovane

Na noite do Recife,
arremetida,
uma suposta virgem dá-se a ensaios
que nem são tentativa.

Não digo que haja pureza,
mas tampouco há lascívia.
É a forma de divertir-se
de quem não é comprometida.

De quem acha que compromisso
é o que se tem com os outros.
E que compromisso é garantia.

Sonha cavalos brancos.
Sonha tardes azuis.
Sonha talvez um poeta
que de longe a seduz.

Seduz-se a si mesma,
nesse estranho mimetismo.
Finge que é apenas no quarto
o que se dá em cima da mesa,
o que é alimento diário.

Não o enfeitado com bombons,
ou seus restos imortais.
Mas o que é encadeamento dos dias,
que a prendem sem saber.

Só não aprende mesmo,
porque é o que quer esquecer,
que só com muita liberdade
pode-se ter prazer.


30 de maio de 2017.

segunda-feira, 21 de maio de 2018

UM MINEIRO

Vim de Minas de manhã cedim.
Vim pra ficá um cadim só.
Peguei o trem de ferro,
quié o transporte mió.

Vim de casaco,
como minha mãe minsinô.
O tempo aqui é lôco,
como o Sinhô programô.

Aqui tem ôtus brio.
Se anda muito mais rápido.
Se anda fora dustrio,
eu nem sei o que quiacho!

Tudo o que vô sabeno
é que num quero confusão!
E que se o sinhô tá nervoso
pode achá que tem razão!

Eu nem nada num acho.
Eu só procuro paiz!
Vô pô uspé nuriacho
e isquecê o dipatrás.


SAPOC, 21 de maio de 2018.

domingo, 20 de maio de 2018

QUE O CRUZES

Para Flávia Berwanger

Nunca, moça!
Nunca te conforme às prisões!
São tão tuas as chaves
quanto são os grilhões.

Escapa à tradição!
Dribla tua mente.
O mundo é teu!
(Que te dessedentes!)

Fartura d'água
traz iluminação.
Do momento que encerra
a escuridão.

Revolve-te!
Vasculha-te!
Acha-te!
Procura-te!

Eu sei que a liberdade
em excesso estiola.
Mas é melhor ser livre
que envergar a bitola.

Lembra o poeta meridional:
"Girando, esquentando
só pra ver até quando
o amor aguenta o caos".

Gira e vira o mundo.
Nem César, nem Raimundo.
Sem rimas nem cifras,
nem solução.

(Porque és tua própria adequação!)

Cruz Alta,
do monte mortiço às nuvens!
O panorama é teu,
que o cruzes!



Manaus, 6 de agosto de 2017.

sábado, 19 de maio de 2018

CARETA

Minhas portas estão abertas
e não as quero às escâncaras.
Pra lá com suas substâncias!
Pouco importa se sintéticas
ou se coisa natural.

(Natural é haurir meu brilho
do plano espiritual!)

Nada de fora conecta-me comigo,
nem sequer concentrar-me no umbigo.
Concentro-me no mundo e o vejo bonito.
(Não preciso falseá-lo pra frui-lo.)

Respeito suas escolhas e os seus motivos.
Só não vai exercê-los comigo.

terça-feira, 15 de maio de 2018

ORAÇÃO

Domingo aponta,
vou orar em sua capela.
As horas não dirão nada
(não me desacoplo dela).

Sinto que nasci para agora,
pra viver este momento.
Para encher-nos de ventura,
e depois cavalgar o vento.

Atravessar as brancas nuvens.
Sentir-lhes a suavidade.
Sabendo a verdade segura
de que Alegria não tem idade.

Vou vivê-la até o fim,
até meu último instante. 
Inspirado até expirado,
ultimado em viajante.

E, viajante, conhecer espaços
já bem distantes daqui!
Sem nunca deixá-la de lado,
a mais bela flor que já vi.



Seref, 23/2/2018.

segunda-feira, 14 de maio de 2018

CISMAS

Punido sem recesso e sem repouso
por desconhecer as regras do jogo
"do fogo das coisas que são".
Outro fogo me queima as entranhas
e desconhece extinção.

Alimenta-se a si mesmo,
num cego esquema retro.
Mas o desconheço em minha essência,
tomando-o por abscesso.
E quero provar meu acerto
perdendo-o no trajeto.

Quero viver dos sentidos,
de que vale a imaginação?
Só vale de asas ao preso
da verdadeira prisão.
Pros soltos presos a disparates
é só requintado grilhão.

Libertem-se poetas e meninos,
homens que de homens só têm o peso!
Vergam sob responsabilidades 
e desconhecem temperos.

Não sabem dosar seus dons,
não sabem o que fazer do dado.
A paz é o mais belo Tom!
Entoe essa música suave.

Só agora!
Só aqui!
Só o que se vê e toca!
E toque essas cismas, Pai!
Que quem as guarda se enforca.


Guarulhos, 5/2/2018.


sábado, 12 de maio de 2018

FAROL

Estou sentado em Tambaú,
lendo a vida de Clarice.
Penso em Belém,
penso no Recife.

Penso em Valinhos,
e em que destino
tanto destino encerra.

(Será que Belo Horizonte
é mesmo a minha terra?)

Penso na subversão
de tudo que quiseram pra mim.
Talvez cabelos loiros,
ou olhos dum claro sem fim.

Pra mim está muito claro
que nada disso importa,
pois faço clarão de tudo!

(Tenho feito em meus desejos
de cabelos e pele escuros).

Gente é um troço tão rico!
Sinto que o é de fato!
Não tenho mais medo dos riscos,
de nada me embaraço.

Já me permito abundâncias
de multiplicar seus recursos.
Pra um uso fraterno e aberto,
nada avaro ou obtuso.

A hora é de viajar longe,
sem sair do lugar.
Contando com a benção divina
naquilo que Lhe rogar.

Peço a arte de reconhecer
todo o em mim investido
como forma de iluminar
muito (o) menino perdido.

Vou observando seus manches,
por ter sobrevivido a tempestades.
Guiando-os a guiarem a si mesmos.
Sempre é tempo!

(Nunca é tarde!)

E torço pra que também prestem
a atenção que aprendi.
E abreviem desta vida os testes,
que nosso lugar não é aqui!


João Pessoa, 26/9/2017

sexta-feira, 11 de maio de 2018

LAGO

Para Ana Grama


Minhas imperfeições são gritantes.
São de vulto, 
aviltantes.

(mas sou melhor do que fui antes).

O erro foi tão feio
que as desculpas são infamantes.
Mas a cada erro sou refeito.

(Já não posso me ser tolerante).

Desta vez não vou morrer!
Me tornei perseverante.
A quem acredita no futuro
peço com amor que se adiante.

quinta-feira, 10 de maio de 2018

CASA

O peito palpita.
A boca seca.
A luz é sempre
a saída pras trevas.

Tudo reclama espírito.
(E o espírito que não se reclame).
Tudo reclama empenho.
(E o segredo que não se proclame).

Estrada reta é sono.
Curvas, insinuação.
A culpa é sempre do mordomo!
(Ou é de quem abre o portão?)

A casa assim palmilhada

é imóvel de muitos cômodos.
Incômodos alguns,
outros de conforto ou assombro.

Já ninguém limpa o porão,
de medo do que pode assomar.
Já ninguém alça ao sótão,
que é só alçapão como está.

quarta-feira, 9 de maio de 2018

TRENCHTOWN

O flagelo do pensamento.
A que se lança o que se entrega
às intrigas da percepção?

Pode ser que ache fúria.
Pode ser desilusão.
Podem ser coisas futuras,
anunciadas na palma da mão.

Talvez tudo estivesse no mapa
traçado pelo céu de sua hora.
Talvez tudo fosse nada
se  houvesse alguma demora.

Talvez a verdade não exista,
só um modo de ver as coisas.
Talvez morra o que insista
em afirmar que não tem escolha.

Não fazê-la é fazê-la já!
E todo alvitre é fatal.
Então ouça o que o peito refolha.
É sua vantagem sobre o que é vegetal.

MAR DO CABO BRANCO

Queria ter os olhos do verde
do mar do Cabo Branco.
Do mesmo impacto aquoso
que arrasta manso e firme.

Esta doçura salgada,
mirante favorecido
dos céus azuis da Paraíba.

Quem trouxe a decepção
ao campo semântico do morno,
quem lhe vê insuficiências,
decerto nunca se banhou nestas águas.

Derrado.

Faltou-lhe divisar este horizonte
por entre poucos, belos barcos.

Eu assisto calado.
Calado de encantado.
E calado constato
que já tenho os olhos verdes
do mar do Cabo Branco.


João Pessoa, 3 de junho de 2017.

segunda-feira, 7 de maio de 2018

COMBUSTO

Quero ser ribeirinho.
Quero ser marítimo.
Quero mas sou terrestre
(não tenho outro tino).


Talvez mesmo nem a terra,
que me sinto desterrado.
Não sei se sou solar
ou se sou ensolarado.

Mas sei que queima.
Sei que ardo.
Sei que ilumino de longe,
mas de perto sou incendiário.

Contente-se com ver à distância
a variação, no durar do dia,
dos matizes com que me coloro
para à noite ter alforria.

Abandonar-te completamente,
inversar-me como em translação.
Fazendo-a sentir-se fixa,
o que é uma pura ilusão.

Então aceite que sou pra ti
o que sou pra todo o resto:
um lume tolo mas feliz
que se acende através do verso.


Cabedelo, 2/6/2017.

domingo, 6 de maio de 2018

A SORTE DA FORÇA

Tenho a sensibilidade por algo tão nobre
que confessá-la seria elogiar-me.

(Elogio em boca própria é vitupério!..)

Oops!
Leonino império!

(Mas dei a sorte da força).

ATÉ LÁ!

Sempre há o dia em que a Lira cansa.
Até lá vou viver de esperança.

De lá,
de lembrança.

MAR-ME EM SINA

Eu e o mar já ficamos
muito e por toda a parte.
Acanhados,
olhares de soslaio,
e eu pensando em piscinas.

Aqui,
dois dias de namoro,
pau duro,
olhos nos olhos,
já fui logo pensando em casório.

Dizendo:
"Mar, me ensina!"

sábado, 5 de maio de 2018

UM NORTE

Na orla de Cabo Branco não se perde o Nord,
que por todo lado se demarca,
demarca-se em rede.

Não é rede que se leve à praia,
não é rede para peixes.
Apenas turistas se apanham.
Apenas turistas num apanhado
que não se permite ser traçado.

(Nem um traço de audiência
de um loiro de outro lado)

Uma variedade tanta
que não é variedade nenhuma.
Tanta gente sempre a mesma
quando a terra não é sua.

Um misto alvoroçado
entre alerta e displicência.
O homem é um bicho tão estranho
que nunca o explicou a ciência.

Ou só seu endo-funcionamento,
que é aquilo que se vê.
Não é um belo bicho esquisito?
O que não se enxerga é o que se pode entender.

Já eu digo que me enxergo,
dia-a-dia cada vez mais.
Eu também renuncio às teorias
e só quero viver em paz!



João Pessoa, 31/5/2017.

UMA SIMPLES CHUVA

Gosto de chuva
se estou ao abrigo 
e não me frustra planos.

Não gosto se me obriga,
se sou pântano.

Se em profundezas me imerge 
de que nada quero saber.
Duas faculdades e a intenção de terceira
pra saber que é simples conceber.

Tudo é o o desejo
e o que lhe permitimos.
Tudo é o desejo
e o que fazemos disso.

Os campos são a fruição
ou o percalço que nos separa da meta.
Ao que ando no agora e feliz 
ela é o acidente da festa.

Recreio-me pelo caminho em que me lancei,
escolho a alegria de marchar,
mas nunca é dado o que obterei.

É o que se chama conquista!

Não é tão complexo,
mas é uma coisa mista:
Amor e merecimento.

Podem chamar-me simplista!


30/5/2017

sexta-feira, 4 de maio de 2018

FREEDA

Quando Fridas 
Eu me calo
Num bonito intervalo
Teu sorriso vale um mando

Como eu que tanto me nado
Me passeio nesse não-largo
É outro mistério profano.

INVERSOS

Fique à vontade,
ou fique a vontade por seu lastro,
garantia da circulação de nada.
E de que valeu-me afeitar-me a navalha?

Foi uma vaidade descarada.
Um limpeza que não limpa nada.
Os resíduos são o lume que se vê ao longe.
Nada do que não se declara se esconde.

Toda luz quer brilhar-se,
mesmo a do fraco,
que só pensa em queimar-se.

Prefere o falso conforto
de não ver um palmo adiante.
Pouco se dá conta
de que nada o garante.

Porque o medo,
assim como a coragem,seu reverso,
é uma espécie de lanterna
que se irradia sobre o que se projeta.

(O que se teme
ou o que se peça).

Pouco se me dá chão ou teto!
Tome e guarde a face,
eu me liberto no verso!



João Pessoa, 30/5/2017.

terça-feira, 1 de maio de 2018

CONSENTIR

A mão recolhida.
A tinta derramada sobre a mesa.
O mata-borrão não faz nada
por pura falta de destreza.

Escrever pra quê?
A boca só diz asperezas...
Nesta espécie de estação
é melhor que a mão não se atreva.

Pra que dar-se à expressão
de uma aflição tão canhestra?
O susto é infenso à solução;
solução exige leveza.

Traz a vida seu nó górdio,
não há proveito em fingir desatá-lo.
Nada desata o ódio,
se há o que finge desbaratá-lo. 

Há quem veja suavidade no mar.
Há quem só o veja arrebentar-se.
Quem o procure pra esconder-se a chorar,
quem vá a ele desanuviar-se.

Chovam as nuvens escuras!
Dissipem-se do que são.
Novo sol, outras nuvens,
com feitio de algodão.

Dadas a se verem nelas
todas as formas de interpretação.
Monstros de muitos pés,
cavalheiro em alazão.

O Bem e o mal em tudo.
A balança é de precisão.
É vital que se reconciliem
o espírito e a razão.

APARENTE

"A curiosidade vergonhosa de um vício".
Sentia-a desde o início.
Intercalava-o com o atrevimento.
Uma ideia bipolar
do que seja o contentamento.

Do que seja só sua trajetória,
frustra,
de rotatória em rotatória.
Sempre o mesmo pedaço de estrada.
(O mesmo que não leva a nada...)

Não se pode melhorá-la
se não cumpre seu fim,
qual seja
trazê-la a mim.

Estranha escolha,
acompanhar-se de carros de só potência.
Um pode ser que a recolha.
Prefere-o à indecência.

Despir-se do que não traja
é uma impossível indigência.
As metáforas se acumulam e a garganta me trava.
Já nada digo,
que não posso vestir a mortalha.