terça-feira, 28 de junho de 2016

A(R)MADO

O amor me armou.
Arma dura, inflexível,
arma descrente no impossível.

Arma libertária,
refratária à censura.
Arma incendiária
(ilumina a noite escura).

Arma de prata, de fogo,
de sol.
Arma poderosa
da aurora ao arrebol.

Tanto poder!
Tanta possibilidade!
E ela apenas assomou
e já se fez tarde.

Já nada posso,
porque tudo espero.
Dela nada percebo
senão um fundo mistério.

Como sofro,cego,
o que não tateio
(mas quero!).

quinta-feira, 23 de junho de 2016

ININSTANTE

O amor...
quem matou?
quem formatou?
quem achou que fui ator,
que fui por detrás dos panos,
que fui um faceiro leviano?

Quem considerou minha postura?
Quem recolheu minhas impressões?
Quem mediu a impostura
impressa nos demais corações?

Todos visitam os sótãos,
ninguém quer saber dos porões.
Todos aplaudem os formosos,
denegrindo os aleijões.

Não veem a beleza do roto,
não veem o que me arrojo
em ser sempre sem estar,
sem mal estar,
sem instar
a que me prestem atenção.

Sou o que não está
mas vou arrebatar
muito incauto coração.

terça-feira, 21 de junho de 2016

ÊS

Eles falam,
fazem, estão.

Eu vejo, 
prevejo, vão.

Eles vêm
mas não veem o rincão.

Estou há muito aqui esquecido,
no meu rico coração.

domingo, 19 de junho de 2016

TUDO NADA

Exílio
(sigilo!)
Degredo
(segredo!)

Me importo,
mas não estou preocupado.
(alado!)

Tudo é intestino.
Tudo!
O próprio destino,
o carma que não te poupou.

Tudo!
Todo o tumulto
que dentro de ti restou.

Não há o que fazer, 
nada!,
braçadas na escuridão.
Nada!,
nada de mais há no meu coração.

("nada" ainda espera tradução)

Tudo nada!
Morte é vida, então!

quinta-feira, 16 de junho de 2016

CÓDIGO VERMELHO

Insidioso,
sorrateiro,
quer-se achegar o inverno.

Resistem-lhe os homens.
Os homens querem calor.
Querem calor as mulheres.

Não querem mais as crianças
do que por-se ao abrigo do frio.

O chocolate codiforme
francamente oferecido à companheira
lhe fala ao coração.

É o amor,
uma cor triunfante sobre qualquer estação.

terça-feira, 14 de junho de 2016

MAIS VER

Não posso fazer nada,
porque só posso fazer nada.
Que alma mais desazada
veio Deus em mim conceber.

Não morri de susto.
Não saltei do viaduto.
O susto é que foi a ponte
de lá para este horizonte.

Antes nenhum problema.
Antes nenhuma antena.
Antes nenhum morfema
(eu era o mínimo de mim).

Nada eu captava.
Mares não navegava.
Eu sequer me pronunciava;
sabia o que era só ser.

Agora sei o ser só.
Agora sei o ser pó.
Evado-me antes do nó,
e os deixo com "até mais ver!".


domingo, 12 de junho de 2016

HOMENSENDO

Eu tive,
já não tenho.
Eu sou,
não me detenho.

A palavra que sou
é tudo que empenho.
Garantia irreal
do melhor desempenho.

Ao longe donos,
ao longe senhores.
Só tenho poderes
sobre minhas dores.

Ou elas sobre mim, 
ambos sofredores
da conjugação
de só estertores.

Não há comunhão.
Não teve meio.
Não teve começo,
mas somos fim.

(Ai, que apodreço!)

Mas só o amor restaura, 
só ele edifica.
Mas se cumpra a vida
sem esferas aflitas.

É acidente feliz,
não está aprazado.
Mas se acercar-se de si,
cumpre abraçá-lo.