terça-feira, 30 de janeiro de 2024

QUANTO ANTES

Há quem seja vento em popa,
em apoio às velas.
Há quem seja âncora,
terra.

Há quem brinde a todos com luz e quem a encerre.
Há quem nem tente e quem erre.
Há o que persiste até que acerte.

As estradas são muitas.
Estrada é decisão?
(Há quem prefira deitar-se no chão).

Mas a estrada não consente,
a estrada insiste.
É obrigatório alcançar o limite.

Quanto mais esforço
quanto antes.
É crime grave matar o instante.

O instante pulsa.
O anjo chama.
A vida não cessa.
É  impossível abandonar a meta.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

SE ENTRETECE

As pessoas nos amam com o que podem e o que são,
não como a gente quer ou julga que merece
(amam como conseguem).

Por isso o amor não é decreto,
acontece.
Quem sabe amar não exige,
entretece.

Do amor se lembre antes
de tudo o que não se esquece.


quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

DISFARCE

Não se apegue à máscara,
ela não te favorece.
Ela apenas faz lembrar
o que jura que esquece.

Melhor sentir o sol.
Melhor receber o vento.
Melhor estourar o claustro,
do fundo desse convento.

E se te baterem na cara,
oferece a outra face.
Toda sinceridade
é mais bonita que o disfarce.

SAZONADO

Tem opresso na mão
o coração.
Ele parece que queima,
mas não.

Não é o caso de arremesso.
Não é o caso de vesti-lo,
como se fosse adereço.

Não é o caso de liquidação.
É melhor o caso de oferta,
numa sincera estação.

Até lá pode cuidá-lo.
Pode até guardá-lo no peito.
Ele saberá emergir

quando for o tempo perfeito. 

domingo, 7 de janeiro de 2024

FOCO

Em dúvida sobre onde reside maior beleza,
na aurora ou no crespúsculo,
vivo para ver o dia chegar e o Sol se despedir.

Nada, então, está parcial em mim.
Sinto, inteiro, o desejo de totalidade.
Eu resido no mundo, não nesta cidade.

E mesmo essa amplitude me parece parcial.
Sinto que, quando penso, o meu raio é sideral.

A vida pede crescimento e,
se me distraio,a dor o impõe.
Por isso vivo melhor atento
ao que só o amor constroi.


sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

MATOU O GATO

A porta está aberta;
ninguém entra, ninguém sai.
Ao que tudo consta,
facilidades não atraem.

Estivesse a porta fechada,
quereriam ver do outro lado.
Bateriam nela,
ou a tentariam explodir.

Por isso essa porta aberta
me faz muito mais feliz. 

quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

Tenho uma certeza esquecida,
uma foto esmaecida,
de um futuro que quer ser. 

Uma saudade confusa,
claridade noturna,
do que me convém fazer.

Um lugar em que estar,
com pontes a atravessar,
demolidas ou por construir.

Então preciso apertar os olhos
e buscar ao peito o espólio
do que ainda está por vir.

terça-feira, 2 de janeiro de 2024

NO OUTRO SENTIDO

Deambulo pela cidade
em que você também mora.
Nem tão longe assim,
nem tão perto quanto outrora.

Aquelas canções são outras,
e estas pessoas nunca existiram.
E talvez volte a ser assim
(e pelo mesmo motivo).

E você quer tanto ir embora!
(mas nem a morte é ida sem volta)

segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

OBRA NOSSA

É preciso uma paz que resista ao tumulto.
É preciso sossego no mundo.
No mundo íntimo, o único minimamente passível de controle.

É preciso ser você na torre, para o comando de si.
A paz só pode começar ali,
com vista para tudo que nos acontece
e selecionando a resposta.

Não digo que seja fácil,
mas é preciso fazer a aposta.
Só ganha quem arrisca.

Também sei que o mundo o complica,
mas ele é do mesmo tamanho por dentro e por fora
(mas o de dentro pode ser obra nossa).