terça-feira, 30 de julho de 2013

APORTE (XIBOLETE 2)

                                
Sinto, ao longo dia,
vontade compriiiiida 
de te ver.
 E só penso em fazê-la cumprida,
como se matá-la 
fosse dever.

E quem sabe não me alcança a sorte
de estar do lado 
de você?

Então chovo,
sou todo convites,
e faço figa para os receber.

E olha que quase
toca-me a sorte,
sorte do porte
de você.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

AJUDAI-VOS

                                                                      Gente de muita fé,
e viciada em barganhas.
Mas o que oferecer a Deus,
o incriado, vida ganha?

Deus não tanto mais ganha
quanto mais o fiel perde;
então é inútil a disposição
de renunciar ao Grapette

Deus não se dá a trocas,
é inútil teu apelo;
então não percas as rótulas
descendo escadas de joelhos.

Dizem que tu tudo podes
Naquele que te fortalece;
então põe reparo no que digo,
e faz reparo na tua prece.

Do que acho que Deus gostaria,
só o que acho que não tem à mão,
é olhar aqui para baixo
e ver ajudarem-se irmãos.

Se a isso nos lançarmos,
se deixarmos de pilhérias,
podemos resolver os casos
e a Deus, merecidas férias.

sábado, 27 de julho de 2013

SUCESSO

Eu gostava tanto de ser publicado!
Não sei porque ainda não fiz
nada para provocá-lo...

Mas provoco outro tanto:

vivo ternuras de portão.
E nos poemas diretos às musas
também há satisfação.

Mas tenho esta busca, confesso:

passar da sala aos salões
e arrebatar mais corações,
num ampliado sucesso!

sexta-feira, 26 de julho de 2013

SENHOR

Senhor, 
diretor pleno de Si,
do Plenário.
Não sou boa criatura.
Melhoro, lento, a postura.

Sei que, a Ti,
não Te sirvo a nada!
Mas não me casses, Senhor,
a palavra!

Serei, de mim
(Te prometo!),
o perpétuo melhorador!
Dou-Te minha palavra,
e a tomo emprestada ao Senhor!

terça-feira, 23 de julho de 2013

XIBOLETE

 

Um xibolete é um convite ao deleite,
de uma dama sem camélias,
numa rua sem ramalhetes,
a um vagabundo erra-o-mundo
ávido por aceite.

É uma promessa de céu,
quando o céu no escuro se esconde.
E quando o dia dissipa o breu,
parte-se a não-sei-onde.

Enquanto os mais puros, dormidos,
recolhem-se, almas claras,
os que não as trazemos alvas
as lavamos na madrugada.

E com tanto lavar-se a alma
muito se ajuda o corpo,
que tanto mais vive quanto menos
passa a noite a fingir-se de morto.

O xibolete é uma intimação
à alegria pra que se apresente;
seja muda e  circunspecta,
ou alvoroçada e irreverente.

O xibolete é a prova mais clara
de que aqui se vive e se aproveita.
E a felicidade, com prévio anúncio,
põe-se logo, esperta, à espreita.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

ALMEJO

Almejo ter sempre a alma capaz
de assimilar a alegria da madeira,
mesmo sendo-o pela morta macieira
cujos frutos já há muito não apareciam.

Em nova vida surge,
em nau erigida,
em alegria esquecida de que
não vence nunca o que ganha o mar.

Mas não há fuga do destino
quando, ainda em desatino,
é toda nossa estrada.

E não gela o nascido pra arder,
nem se firma o nascido pra singrar.

Içar âncoras!
Alçar velas!
Expandir-se!

Enfrentar!

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Pessoalmente

Padeço. Tanto estou enamorado da inércia que sofro uma grande exasperação com a menor das transições. Sofro com passar do sono à vigília; da vigília passar ao dia propriamente; com vê-lo toldar-se em tarde e a tarde desabrochar em noite. Ainda que antevendo a absoluta falta de desafios a que cada uma dessas etapas me conduzirá. Ainda sem lamentar que não os haja. Não me sinto fixado aos dias, e parece-me que deslizo sobre a superfície da vida. Só me concilio, âmago e exterior, quando concilio o sono. Talvez por ousar no sonho aquilo a que na luz não me atrevo, talvez porque é só o sonho que produz realidade, ou talvez porque só ao abrigo da consciência suporto o nada a que se reduz a virtualidade da minha cruz. E me doo muito existencialmente para que de fato viva quando pareço agir.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

LUSTROS

Minha vida é esta:
nunca o lustro de uma distinção.
Com lustros só faço décadas,
já três perdidas, vividas em vão.

Queria ser dessa gente-alegria,
da gente esquecida de sua condição.
Mas esquecê-lo é presente dos tais poucos
"que andam loucos de satisfação".

A vida é feita de procura,
não é outra a loucura
deste tolo coração.

A vida mesmo finda não se conclui,
e o que nela jamais se inclui 
é sua própria explicação.

terça-feira, 16 de julho de 2013

FRACASSO

Fiasco! Fiasco! Fiasco!
Não sei por que diabos
não me abraço com você!
(Seja esse carinho um jeito
 de deixar de o temer!)

E no meu caminho não me arrisco
a encontrar-me com você.
E o faço de um jeito estéril:
o de deixar de proceder.

E assim não resolvo o mistério,
nem erijo dúvidas;
apenas vivo as desculpas
que me dou pra me conter.

Fiasco! Fiasco! Fiasco!
Não triunfo, não me lasco,
não me aplaudem ou escarnecem,
e o medo não o enternece,
só me aumenta o padecer.

Fiasco! Fiasco! Fiasco!
Um dia em você eu mergulho,
e a ver se logo me debulho,
que o passado se pode esquecer!

domingo, 14 de julho de 2013

ENTÃO - AGORA

Eu gosto mesmo muito de lembrar;
tanto que creio só ter vivido
para agora ter no que pensar!

Visitar de novo aquela infância,
que ao tempo me parecia tão normal,
e que agora, vista à distância,
se mostra tão especial!

Reviver a primeira namorada
que, superada, era coisa esquecida,
mas que agora, rememorada,
me parece a terra prometida!

Ou devo talvez me concentrar no agora,
que por ora me parece mero instante,
mas que depois, em retrospectiva,
se revelará de todos o mais importante!

quarta-feira, 10 de julho de 2013

RESTA UM

Dizem pra eu ter cuidado,
que o meu jogo é o "resta um",
mas não me parece o mesmo
ser sozinho ou singular.

Quem é que prefere
das ajudas a imposta?
A conjugar-me digo "SIM!",
mas jungir-me não é resposta.

Tantos o querem pela festa!
Muita mulher eu sei que gosta.
Mas, exaurida a cerimônia,
muitos já se dão as costas.

Mais me interessa a intensidade
que o rótulo ou o regime;
mas dito isso às casadoiras,
me olham como ao pai do crime

segunda-feira, 8 de julho de 2013

OLHOS SORRIDENTES

Senhor, faça sorrirem os meus olhos!
É só arquear-lhes os lábios que têm.
Para sorrirem não precisam boca,
nem dependem de ninguém.
Basta ver que a chuva faz poças,
e as mães sorrirem nenéns. 
Não se umedeçam do tempo que passa,
e saibam que também o tempo vem.
Não lhes peça que se poupem,
mas lhes diga que se aventurem.
Vejam ao céu rasgar o avião
e por aqui passarem trens.
Vejam a tolice do que se curva
para do chão apanhar o vintém.
Sorriam porque existem férias,
e no mundo há gente de bem.
Sorriam porque a flauta é doce, 
e ainda tarda o réquiem. 

sábado, 6 de julho de 2013

NOITE É DIA

Fora dia iluminado,
ornado por muito sol,
e foi (curiosamente) clareado,
superado o arrebol.

Pois estrelas chegam à noite,
são a alegria do crepúsculo.
E se o Sol é pra vida obra-prima,
a estrela brilha a condição de opúsculo.

Pois alegria, perceba,
também se sente em discrição.
Não se medem arrebatamentos,
forte o de crente recluso,
forte o do folião.
E o carinho, sendo sincero,
é uma forma de oração.

Então peço ao Sol, humilde,
que se comprometa em juramento
a brilhar intensamente o dia,
deixando as estrelas no meu firmamento.

E que a obra prime pela duração!

sexta-feira, 5 de julho de 2013

ALEGRIA FRANCA

Não quero ser cingido com nada,
elites são coisa odiosa!
Gente sem nenhuma poesia,
e que anda vazia e... prosa!

Acumulam-se meios e títulos,
e é tudo coisa sem fim.
Melhor faziam em atentar aos filhos
ou em namorarem com beijos carmim.

Mas a opulência muito lhes pesa,
e os torna pobres de espírito.
Mas eu quero viver outra era
e não tenho mesmo nada com isso!

Então vá longe a gente abastada,
que vou errar à cata de alegria.
E não vou dizer que esteja errada,
a vocês champagne, a mim a sangria!

quarta-feira, 3 de julho de 2013

INSOSSOS

 Anestesia, sinestesia;
sentido nenhum, ou outro, ou tantos!
Se estivesse ao meu alcance, entorpecia,
pra nem assim eu me livrar dos teus encantos!

E nunca cuidei que houvesse compromisso
em me deixar embaraçado do feitiço.
Mas se é pra fugir-te já não sou automóvel,
faço-me inteiro enguiço!

E se fosse Deus mesmo piedoso,
não me poupava à água,
não me poupava ao fogo,
e não achava graça em aprisionar-me
nos dias sem ti: insossos!

segunda-feira, 1 de julho de 2013

PEQUENA MORTE

Pequena Morte, que sorte!
encontrar-me com você.
De outras sortes maiores
não extraio o mesmo prazer.

Por que por seu show diminuto
é tão fácil que seja tragado?
O mundo é tão vasto e são tantos
os encantos a serem explorados!

Tanto se respira 
havendo tanta amplidão,
que é de se estranhar quem se confina
entre paredes, cama e canção!

Pequena Morte, que sorte!
e já pouco me importa o resto!
Só lhe peço que me moleste
(e nem lhe pediria os recessos...)

Só posso morrer interino
(nada de morrer-me inteiro!),
E vou alardear nossa sorte
cantando-a no chuveiro.