segunda-feira, 31 de outubro de 2022

CINEMA

A fraternidade é vermelha.
Não tem peias,
não arrefece.
A fraternidade ninguém freia,
permeia o que a gente tece.
A fraternidade não apeia,
ninguém a enfraquece.


A fraternidade enfrenta.
A fraternidade à frente.
A fraternidade é da gente,
não é de coisas,
de coisos,
de coice.

A fraternidade não tem foice,
tem "foi-se!".
Tem coração,
viola,
abraço.

A fraternidade no nosso regaço
e nosso passo
o da imensidão!

sábado, 29 de outubro de 2022

ARCA

Eu escrevo maus versos,
mas preciso.
Então os jogo pro Universo.

E o Universo sabe encaminhar tudo,
até os meus maus versos
pro Gabriel do futuro.

Ou um Gabriel do futuro;
os futuros podem ser tantos,
e eu, por encanto, também.
Então prefiro libertar-me
a tornar-me meu próprio refém.


Adentrar-me.
Descifrar-me com bravura.
Aproveitar o tempo que tenho
do embrião à sepultura.

Escrevo.
Assino embaixo.
E só não canto porque não sei cantar.

Mas vivo o que preciso.
Não tenho medo, nem me dura o pesar.

Vejo.
Me assombro.
Me recolho.
E me reponho.

E noto que atravesso lúcido
esta espécie de sonho.

quinta-feira, 27 de outubro de 2022

CANTADO

As pessoas não sabem sob que trilha eu as avisto. 
Já não há a luz vermelha do walkman,
e eu não lhes aviso.

Já não sabem, de suas expressões,
o quanto alcanço, neste põe-óculos-tira-óculos
a que, pela idade, me lanço.

Eu não quero saber o que pensam para facilitar-me amá-las
como se não houvesse amanhã: sem amarras.

AS canções sabem tudo.
Quem canta, fala.
E as notas às vezes distraem
das verdades mais pesadas.

O medo é natural e é péssimo conselheiro.
Não esconda o seu amor
(te canto do fundo do peito.)

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

ORTÔNIMO

 "...é solitário andar por entre a gente",
"mais solitário que um paulistano".

Mas o pano não cai.
E a peça prossegue, o proscênio.
E ali há piores que eu.

Piores para quem pôde ver.
Você pode nem vir a saber,
contente, pipoca e cinema,
com o ex que outra lamenta
sem saudades, ou até com alívio.
(Ele também já esteve em cena...)

E a vida tem mesmo seus apartes,
ou nos seria muito covarde.
Pesada demais sobre nossos ombros sem natação.

Mas na próxima haverá acertos.
Talvez até conte azulejos!
(e os ombros quiçá me cresçam...)

Tudo na vida é exercício.
É um implantar no ser eterno,
numa marcha para o infinito.

E o que era lote vira edifício.
Dos cimos a vista é bela,
de onde já menos se erra.

Fui Navarro, fui Castela.
Fui Nogueira sem ser Fernando António.
Já fui até uma pessoa!

(Olha só como o tempo voa!)


domingo, 23 de outubro de 2022

sábado, 22 de outubro de 2022

PERSISTE

 "Le dije a mi corazón,
  sin gloria pero sin pena
  no cometas el crimen, varón,
  si no vas a cumplir la condena."

Chegar em casa logo antes da chuva
parece sorte pra quem quer que fuja.
Mas quem quer fugir? Quem tem medo de molhar-se
quando pode ser tão bom e tão fácil secar-se?

Menos se vamos encharcados.
Se imersos,
se totalmente tomados.

(Fico pensando se num tal caso
não seria melhor exorcizar-nos.)


Mas o tal brilho eterno de uma mente sem lembranças,
sobre ilógico, é pobre.
De que é feita a esperença senão
da estrada que se percorre?

Não lamento os passeios, segredos,
nem as risadas por nada.
Eu ainda vou cheio de quanto nos inspirava.

Vou cheio e de tal forma pleno,
que talvez o imperfeito não se justique.
Mas melhor o puro e simples
presente pro que persiste.



quinta-feira, 20 de outubro de 2022

TUDO OU NADA?

Tudo voltou à desimportância
de que eu me distraía: 
os quadros nas paredes,
os livros nas estantes,
os ítens sobre a pia.

Tudo era muita coisa
e eu de nada carecia
como carecia do que me faltava:
tua companhia.

É como o Sol raiar na Terra
e eu não me dar conta,
estratosférico, sideral.

O americano que perde o baile,
criança que não tem Natal.
Todos instados a sermos fortes
e dando pinta de bravura.

Dando prova de ignorar
a nossa própria tessitura.
Não sabermos do que vamos feitos,
o que nos vai bem.

Só no espelho retrovisor,
em estrada sem acostamento.
Com fome.
com sede
(tormento!)

No sentido errado,
o único já possível na direção.
Pistas lotadas,
mão e contramão.

Será preciso tanta certeza
de pra onde se vai quando nos lançamos?
Talvez seja a fé a mais
que me faltou, profano.

Agora, convertido,
me pego com Deus no escuro.
E às vezes lamento o passado
sem nem por isso temer o futuro.

Tenho os olhos habituados
a essa espécie de escuridão.
Mas não me faltam outros sentidos:
tateio estrelas na imensidão.


quarta-feira, 19 de outubro de 2022

MESOFÁCIO

Não existe um poema definitivo;
o que fizesse o poeta deixar de escrever 
depois de tê-lo escrito.

Nasce o sol e não dura mais que um dia.
E outros sois vêm, ou o mesmo,
relativamente diferente e suas alforrias.

Amar o perdido deixa confundido este coração.
E o coração segue. Ele não desiste da carreira.
Não tomba, bomba. Bombeia!

As coisas findas, muito mais que lindas,
essas ficarão.

E tudo se metamorfoseia.

Eu amo tudo que foi.
E sim! Até a fé, jamais errônea,
que faz de toda dor impulso,
nunca coisa medonha.

O ontem que dor deixou.
O que deixou alegria.

E eu nem sei o que já se foi
E hoje já é outro dia.

Como dizem os poetas o que eu diria!
E tudo foi sempre assim.
Mas e o poeta?
Seu ofício é sentir.

domingo, 16 de outubro de 2022

PRAÇA

 Mas claramente!


É praça depois do cinema.
É Belo Horizonte, mas podia ser Amsterdã.
Ou Amsterdão, se o dissesse de Lisboa.

Tem cachorro mas não tem gato.
Tem crianças, tem namorados.
Tem pipoca, tem sorvete.
Tem perdidos e tem achados.
Tem algodão e as próprias nuvens
(que não fazem o dia nublado).

Tem um cheiro doce, doce.
E tem muitas folhas no chão.
Tem algazarra de passarinho 
e poeta de bloco na mão.

Tem o banco e está liberado.
Mas não tem a morena
(e eu fico pardo...)

Pardo mas ensolarado.
Um cachorro até sentou do meu lado.
Ele não é muito de latido.
Não pergunto seu nome por medo de não ser respondido.

É bonito, o danado!
E toda essa língua é simpatia.
(mas simpatias não vão me ajudar.)

Mas a música, sim!
Em toda ocasião.
Música de paz, de sono ou paixão.
A da praça é de plenitude.
E praça é de uma alegria incompatível com a quietude.

E o cachorro é mesmo simpático.
E fica chamado Platz.
E o supermercado não tanto me apraz,
mas é mesmo necessário.

Adeus, coreto!
Adeus, passantes!
Já não tenho longos cabelos
mas os sinto esvoaçantes!

sábado, 15 de outubro de 2022

MECÂNICA CELESTE

Para Fafá

A vida é mesmo um sonho
de que não se acorda mas se pode embelezar. 
Trazer perto "quem" de verdade importa,
que "que" é adorno.
Não importa tanto nem se enche o olho.


Canopus, Sirius, Antares.
E tudo avermelha 
todos os meus andares.

Não "ando meio desligado",
ando em sintonia, canalizado.
Não preciso pensar-te às 23:59 para mudar o dia.
Nem às 17:17 para pensar-te com alegria.

Tudo que acalento é verde.
Tudo se ativa.
É tudo doravante.

Em algum museu o passado ainda está acontecendo...
Mas quem vai ao museu senão em terra estrangeira?
Vida mesmo é dia de feira.
E os meus são teus, segunda a sexta.

Como os dias que os separam
e nos reúnem mais.
Aquele tempo-espaço que a tudo se presta.
É tempo de carinho e pode ser tempo de festa.

Como a da retina se te vê,
enquanto os olhos marejam se te perdem.

O futuro é uma terra bendita, mágica,
que vai-se tornando presente conforme se palmilha.
Para o futuro há picadas e trilhas.
O futuro, quando é perto, está a milhas!

Minha preferida miragem.
Um quadro pra que se olha desde o "aqui e agora"
e mais se embeleza quanto melhor se vive.

E o que é viver senão dedicar-se?
É a pessoa,
é uma causa,
e os reúne o amor.

Sim, o amor!
Amor, a incubadora da evolução.
O amor é a esperança,
não a ilusão.

Para ele a conjunção é viável,
abrem-lhe as portas todos os horários.

E eu?

Bem, meu bem,
eu lhe sou favorável!


terça-feira, 11 de outubro de 2022

AQUÁRIO

Às vezes acho que sou o que serve
para você valorizar o próximo.
Às vezes acho que não sirvo:
sou tóxico!

Talvez tenha sempre sido,
antes mesmo de o termo pegar.
Ou talvez seja tudo só medo
de nada mais esperar.

O que tá pegando é que sofro
em turnos de choro (em revezamento).
E às vezes me pego sorrindo,
como se em contentamento.

"Como se" é o que não é.
Mas de quem tem certeza duvido
(meu estranho ato de fé).

Deus está comigo
porque não tem remédio.
Deus está comigo
na inspiração e no tédio.
Deus está comigo;
(Ele até mora neste prédio.)

Mas agora me espera vestir-me.
Espera-me melhorar-me.
É Ele que espera por mim,
conforme Jesus vem falar-me.

São livros.
São preces.
É vigilância.
E um dia me sai natural
a constância.

Deus está comigo,
mas me faltam sentidos para provar.
Deus está comigo!
e remediado está!

sábado, 8 de outubro de 2022

JANISCITA

Gosto quando o humano sai!
Gosto porque o humano volta.
Gosto do som da garagem,
gosto do do abrir da porta.

Gosto de ouvir meu nome.
Gosto de massagem nas costas.
Gosto da ração completa,
goto da água reposta.

Gosto mas não dou na cara.
Gosto, mas não façam aposta.
Gosto muito! E gosto também
de quem acha que não me faz falta.

sexta-feira, 7 de outubro de 2022

PRA MAIS!

Para Fafá

Passam os dias,
o tempo morre.
Sem cores.
Sem sorte.

Passam os dias
ou é só o calendário?
Avançam as horas
ou só muda o horário?

Muda o confuso.
Muda o paralelo.
O que me responde não soa
(É interno!)

O inconsciente grita sombras.
Grita ânimas, animais.
Muda o meridiano
ou jamais?

A pesquisa se pronlonga.
Estende-se o entendimento.
E o entendimento me muda,
contentamento!

Há de se saber olhar.
Há de se saber ouvir.
E pra quem sabe o silêncio
nem é tão mudo assim.

Às vezes me esclarece
mais que o sol a pino.
E esclarecido me alço
ao divino!

Tenho vida,
tenho paz.
E tenho esperança
(pra mais!)

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

QUINTAL (Singalong)

Para Fafá

Crianças brincam no meu quintal,
é uma escola. 
Como todo quintal é uma escola:
o que se planta se colhe.

(mãos à obra!)

Crianças brincam no meu quintal,
é uma escola e isso me alegra.
Como toda escola me alegra:
errando se aprende

(e vivendo se erra)

Mas não se deve viver de errar,
se esse tem sido seu erro.
Erro bom é tentando acertar,
e quem tenta conquista o recreio.

Crianças brincam no meu quintal
e não têm a vergonha de serem felizes.
No uniforme assumem sua condição:
são perfeitos aprendizes.

Eternos e eternamente.
A vida não passa, só muda.
Transmuta.
É alegria e é sofriento

(Viver é seu próprio fermento)

"É o sopro do Criador
numa atitute repleta de amor".

A vida é uma linda canção.
Afinem-se!

Verão!


"Mas isso não impede que eu repita..."

terça-feira, 4 de outubro de 2022

INIMIGO MEU

Inimgo meu
Criado em mim
O que foi que te fiz
para criar-se-me assim?

Inimigo meu
Portador do meu mal
O que foi que me fiz
para criar-se tal?

Inimigo meu
Refletido no espelho
o que eu me farei
para mudar-te inteiro?

Se assisto às lições,
como se em recreio,
como vou te inteirar
de ter sido meio?

Meio egoísta
Meio orgulhoso
Meio feio
e muito curioso:

Se o mal que não quero faço
E não faço o bem que te quero
Onde o Todo Poderoso
quando desespero?

Enemigo mío,
dentro suyo,

Onde está você?
Ficou tão escuro!