quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

ÓCULOS

Para Diogo Nogueira Maia,
e para uma guria que os limpava pra mim.

"Cada um tem o seu ponto de vista;
 encare a ilusão da sua ótica". - H.G.

Meus óculos estão sempre sujos,
não adianta limpá-los pra mim;
e atrás dos seus os seus olhos
também são um pouco assim.

Veem o mundo com algum prejuízo,
é sempre assim a visão;
ou há loucura ou sobrejuízo,
e é tudo estiolação.

Algumas vezes a mancha, a nódoa,
conserta o que vejo adiante;
nem sempre a beleza das horas
tem a pureza de um diamante.

Mas também podem ser para sempre,
sejam elas manchadas ou não;
e vai saber qual de nós mais entende
da telúrica rotação!

"Telúrica" ou "terrestre"?
Tanta palavra que a cabeça esquece!
Qual é exata pra que fim?

Vivo o acidente da palavra;
topadas me ajudam a encontrá-las,
e se me vêm destinam-se a mim.

Eu as recebo, embaralho e cuspo;
faço fácil, não há custo.
Mas não era outro o assunto?!

"Óculos do John ou olhar do Paul?",
em óculos ou em olhar o rock errou?





quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

XARAPIM


Para o Sandrokito Gabrielzim


O Xarapim é um menino ladino,
como o Vinícius cantou.
Dizem que, nas bandas de Uberaba,
ele é o que toca o terror!

Raspa o joelho,
quebra o dente;
nem se fica enfermo
a festa fica pendente!

É o orgulho da mãe,
mais Sandrokita que nunca;
se o bonito apronta feio,
franze o sobrolho e coça a nuca.

Dar uma coça no menino?!
Isso nunca se pensou!
Deixemos ficar o castigo
um dia, para Nosso Senhor,

que sabe melhor do que nós
que criança é preciso;
pois se não ficamos criança
nos encarcera o juízo.

Xarapim às vezes fica quieto,
a voz não lhe sai e parece calado;
mas é um silêncio de esperto,
e irrompe rindo, fantasiado.

Fantasiando eu é que estou;
nada do que digo
a mãe me confirmou.

E sou capaz de jurar
que é tudo verdade!
E devo experimentar

ainda que só mais tarde!

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

PERFUMADO


Para Flor,


Já são cinco,
e já não é crime estar acordado.
O crime é o leito vazio,
sem você do meu lado.

Às duas tentei um vinho,
mas me desceu quadrado.
Também tentei seu livrinho
sobre o rapaz iluminado.

Iluminou-se sob alguma árvore?
Porque também pensei no Newton,
iluminado sob a macieira
(rapazes, me deem a receita!).

Preciso estar iluminado
para ser iluminante?
Pois precisam aqui do meu lado
do que eu já sabia antes.

Do que eu sabia de cor,
sem que me dessem corda;
desde o líquido amniótico
daquela abençoada senhora.

Chamando-se a moça Flor,
não podia ser diferente:
muito mais do que uma faca,
tinha talento pra gentes.

E é como tenho dito,
tornando em meu o ditado:
Todos os caminhos levam aroma
quando se está perfumado.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

SÃOS

A Academia diz "Vejamos!...",
e "Alvejamos mais um!
Não inovou em nada,
vá-se à vala dos comuns!"

O que a Academia não sabe
é que trabalho na repartição;
não há nada mais natural
do que ver comum meu pobre quinhão.

A poesia é um prédio público,
mas há santos que canonizam o púlpito.
Pregam-se no altar da apreciação,
e já nascem sepultos os que são o que são.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

OUTRA ALEGRIA



A moça está de noite,
e parece que está inteira;
como foi a festa da carne?,
esteve para brincadeiras?

A festa foi muito boa,
pela primeira vez fui às ruas;
eu que não gostava de folias...
E você, como foi a sua?

Alguma aversão à folia
notava já na moça, intuía.
Estranhei, na foto que me veio,
ver que a moça se dera ao recreio.

Também por aqui se foi,
"ozamos" uma chuva imensa;
e estando os mineiros sertanejos,
até que foi uma bela recompensa!

Pois eu não queria viajar,
nem tampouco ficar em casa;
a experiência antropológica foi boa,
a que na folia se disfarçava.

Até mesmo pulei um pouco,
meu pai sempre nos disse:
"Não basta trabalhar a mente,
é preciso mover o corpo!"

E eu acho que seu velho estava certo,
ou pelo menos é o que me parece!
É preciso pular o carnaval,
nem que um dia, para ver o que acontece!

(A gente às vezes pensa que não,
mas muitas vezes a gente se diverte!)

Sou dada a elucubrações internas,
isso não nego, é fato!
A moça até pode sê-lo,
mas tem de ir da potência ao ato!

E, sendo coisa que se faz o ano inteiro,
a moça não perde nada
por no carnaval dar-se ao enleio,
pulando no meio da criançada.

Sim! É como férias de mim;
no carnaval ausento-me assim!
E se sentiu-se a falta perigosa,
talvez tenha sido pênalti!

Fatal para nós, 
fata para si.
E nos despedimos aqui!

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

ENGENHARIA DE MINAS

"Eu já fui cego.
 Já vi de tudo.
 Já disse tudo e fiquei mudo" - Agagê

Eu sou "o que não foi impresso",
o que não impressiona ninguém.
-Eu sou o Cego Ego!
-E daí?! O que que tem?

Sem bandeiras nas fronteiras tuas,
desde a primeira até a última.
A última é a primeira que se viu;
boa mesmo foi a da "puta que pariu!"

Não se calcula o da mina escura,
pira a espora e o cavalo continua.
Funda-se fundo o que não me afundo;
falei só besteira e achei que fui profundo.

Pro fundo já?

"Sou cego, não nego.
 Enxergo quando puder.
 Só vejo obscuro objeto, desejo indireto.
 Será que você me entende"? - (GESSINGER, Humberto)

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

GENTE BONITA (Dura condição)

Para Klik e Bortolo, de um lado.
Para os outros, de outro.
E você, assina a lista do comum?

"How does it feel to be
 one of the beautiful people?".-John Lennon


"Gente bonita":
cuidado com o escopo disso,
com belezas censitárias
eu não assumo compromisso.

Estranha generosidade,
relógios maiores que os braços;
(mais) sentido menos horário:
menos horas, mais abraços.

Tenho dó de trazerem no peito
emblemas de equitação;
às vezes o que têm de cavalos
não passa da educação.

Costumo ver gente mais nobre
pilotando pangarés;
e se a gasolina sobe,
essa gente anda a pé.

Não que o dinheiro vincule
os hábitos e os usos,
mas alguns eu tiraria da zona,
e jogaria no Pólo sul.

Na Zona Nordeste que habito,
a seca ainda não chegou;
e só me molho no açude
do mais rico rock n' roll.

Eu nada tenho contra o Lord
afeito às mesmas guitarras,
mas há palhaços nos Circus
que de rock não entendem nada.

Mas quer saber de uma coisa?,
cada um dá o que tem;
de beleza entendo pouco,
e não custa tantos vinténs.

"Má que beleza!", eu digo,
diante da beleza que faz o que pode;
mas tem gente que só vê beleza
nas MAC belezas de free shop.

E eu prefiro liberdades outras,
como a de talvez nem consumir;
mas sem o carro certo,
desejos há que hão de sumir.

Então cada um que aplique,
se honesto, como quer seu quinhão;
mas as de apliques iluminados
não fazem subir minha condição.

Digo-o descendo Bahia da Floresta:
muita chuva, muita festa;
e não preciso chover desculpas:
cada um sabe o que presta.

Então faça-me um favor:
não preciso de favor nenhum.
Requinte ao máximo seu sabor,
eu assino a lista do comum.


"Nem toda obra se prima.
Nem tudo que é pobre se rima.
Nem tudo que é nobre se esgrima.
Nem tudo que sobra é lixão.
Nem tudo que fito é o que vejo.
Nem tudo bonito eu almejo..."-Vander Lee

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

DESDITA (Cafeteria Mineira) - Feira dos Produtores II

Para Dita


Você não acredita!
Uma tragédia logo cedo!
Eu não assisto a jornais, 
nem os leio, mas esta me veio!

Na Cafeteria Mineira,
quem a conhece não a esquece jamais!
Mas o digito no telefone:
atenderá a outros ramais.

Espalhar a rama pelo chão,
ou quem sabe por que ramos se espraia!
Minha tia gritou lá de Santos:
"Pode arrumar a mala!"

Todos querem ver o mar;
mar dita férias à Dita.
Que férias?! Se aposenta!
(Férias na minha fantasia...)

Não é que a Lídia, por jovem,
não me possa bem atender;
mas serve o cappuccino tão quente,
que chego a me arrepender!

Fico sonhando com os sucos
de  um box de mais pra lá:
faço a combinação que desfruto,
e me deixam beber o que sobrar.

Voltemos ao desjejum:
Não sou "Melhor Impossível",
e me pode atender qualquer um
(por sorte, qualquer  uma!)

A Deici é bem humorada,
será bom quando for sua a vez!
Mas confesso certa apreensão
com a incerta folia da Reis.

Quer saber? Gosto das três!
Minha fome não vai distratá-las.
Mas até a Dita eu chamava pra briga,
se queria minha conta quitada.

Mas já dizia o meu velho:
"Não tem jeito! A vida chama!"
Vai descansar, isso não é desdita,
desde sempre esta Feira te ama!

Caramba! Já chega o dia!
Eu me desdito no fim do mês!
Mas com broinhas e meninas tão boas,
é certo que sigo freguês.





segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

TEORIA DISSO TUDO (O caso Hawking em cartaz)


O físico mal tinha físico!
O físico era um grande espírito,
mas cria-se uma grande cérebro.

Criam-se de um grande cérebro
teorias de quase tudo.
Não espanta que grande cérebros
sejam casos de estudo.

Mas que grandes espíritos sem quase físico
tenham casos de adultério,
parece caso de artifício,
mas pelo jeito o caso foi sério.

De tudo o homem engendra
para afastar-se de Deus.
E o faz caso não entenda
tudo o que (o) (a)cometeu.

Mas é casual, isso não espanta,
que um cosmólogo seja ateu.
O que não explica a força (e foi tanta!)
que Ele lhe concedeu.

Onde prima a razão
há caso de magistério,
mas a obra que mais se prima
segue caso de mistério.

Gavião, falcão, aves outras;
onde faltarem mãos,
ter garra não é coisa pouca!
"While there's life there's hope".

E o físico ainda é!
Não lhes parece caso de fé?

domingo, 8 de fevereiro de 2015

SEM JUÍZO

Estou no bico do corvo;
daqui já não me movo.
Estou mais inamovível
do que meu amigo juiz.

(Disse-o por pensar neles à palavra;
nem inamovível eu encarava.
Nem ganhando auxílio pra morar,
quando os proventos tão bem sustentavam.)

Mas ao topo de novo:
Estou no bico do corvo
e nem com amigos promotores me salvo:
sou estertores!

Mas sabe, a vista é esta:
Nem "subir Bahia",
nem "descer Floresta";
a vida é o último dia.

Não importa se foi abastada,
não importa se foi modesta;
a vida se vê acabada
e não queremos deixar a festa.

O meu caso seria bem esse;
não fui bem escravo dos prazeres,
mas cultivei  meus interesses,
investindo-lhes tempo e dinheiro.

Foi muito A.T.P.,
muita caloria, muito fosfato;
não cedi a percalços e fardos e
Poliana, de tudo tirei um caldo.

Fico pensando nessa gente precavida,
que tem outras preferências;
gente que depreca a vida
por não ser de sua competência.

Desaforam o julgamento,
levam o réu que são a outro foro;
poupam-se todos os tormentos,
e desejam os emolumentos dos outros.

Mas não gasto com eles mais tempo,
estou no bico do corvo.
Já deu a hora: 21:15h:
Corita acertou a hora do pouso.


CNF-BSB, 6/2/15.

sábado, 7 de fevereiro de 2015

EMBARQUE REMOTO

O voo atrasa.
Todos se adiantam.
Não adianta nada!

Se adiante não têm asas,
não há escape,
azafamadas!

Essa gente parece alada,
mas gosta mesmo é de dar no pé.
Pelo jeito todos eles:
homem, criança, mulher.

Uma pressa pra adentrarem!
Acho que gostam de esperar,
pois, sem os retardatários,
a nave não vai decolar.

Há todo tipo de gente,
gente instruída e sem qualquer prova.
E gente que está no processo
de experimentar coisa nova.

Vão todos chegar juntos;
esse tumulto a que vem?
Vem da fissura burra
do impulso de se dar bem.

Não há vagas limitadas na terra
em que todos vão pousar.
E eu voo, mas em outra esfera,
nem é preciso decolar.


Confins, 6/2/15.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

CHOOSE AND DIE (Pink Freud all over...)



"Optar é morrer!",
disse o Drawin.
E por quê, ó diabos,
disse-o a mim?

Maldito momento
o em que esse portento
foi tragado pela Filosofia.
(Se tivesse ficado Direito,
 desse jeito não me desservia...)

Que armadilha na escolha!,
já não se vê o que antes se via.
Morre-se a cada dia um pouco,
sou os dejetos da vida.

É chegada a tal hora,
dia da submersão;
espio da escotilha:
Que interessante visão!

Bom mesmo é ter sido escolhido,
acidente ou no momento preciso
(não que me faltasse algum crivo...);

escolha feita, intuo algo incrível!


"
Do you take what I take?
 'endurance' is the word;
 moving back instead of forward
seems to me absurd"-Idem



terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

PROSAS AO EM VERSO


O que me disseram,
quando me bateram na cara a porta,
é que havia poetas foda
tramando maneiras novas
de mudar completamente
o que era uma coisa ótima.

E que eu me fosse logo,
que não tinha sentido só sentir.
E que me faltando cabeça
eu não tinha razão de existir.

Disseram-me isso bem prosas;
chorei  meu inverso e fui embora.


domingo, 1 de fevereiro de 2015

VERDES (Meu primeiro livro e Primeiro me livro)



Para Mel, Tistu, e Maurice Druon.


Sinto-te me vindo,
e me sinto bem-vindo eu também.
Sinto que meu estribilho
é um estampido do querer bem.

Vejo até que construo
o que intuo desde Miraflores,
muito antes de me pores
uma florzinha na lapela.

Antes de nos ajoelharmos
em praia, campo, ou capela.
Antes dos expectantes,
expectorarem-se da espera.

(os decanos só estarão contentes
 quando nos souberem nubentes)

O ano era o de noventa,
e a série era então a quarta
(corrija-me Tia Maria Luíza,
 se acaso a memória me falta).

Tistu era um menino bonito;
não o digo tanto dos traços,
mas o bendigo pelo estilo
escolhido pro estardalhaço.

Não inventou a pólvora,
seus olhos só viam amores;
e transformou Mirapólvora
na mais bonita Miraflores.

E tinha um toque verde
mais bonito do que o de Midas;
porque o que escolhesse a dedo
ficava verde de vida.

Vejo o mundo com seus olhos,
também aprendo o dom da esperança;
e pelo ritmo com que agora melhoro
talvez me melhore a aliança.

Mas a aliança que me comove
é a da própria comunhão;
pouco importa que a celebremos
além da nossa própria expansão.

A alegria é a de conjugar-me,
de achar-me sempre ao pé de ti.
Espera, do que estou falando?
Só queria que passasses aqui.