sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

GRILOS

Cai a tarde e as nuvens se esticam,
como se à cata de sol.
Por que tanta melancolia,
se tão bonitos os tons do arrebol?

Talvez fosse de bom tom
aceitar a noite e seus bichos,
mas em horas tão griladas
não sei o que faço comigo. 

E você lá andando distâncias,
cancelando a verde esperança.
Fica assim a coisa preta 
e me azulo todinho.

(E serei eu a me ensinar
isso de ser sozinho...)

Sozinho me morro,
não sem companhia;
é mania diária
morrer-se o dia.

Se não entendeu dou-lhe cores:
isto aqui é um convite.
Tá pra nascer o ensolarado
que sozinho não se aflige!


sábado, 18 de janeiro de 2014

SÓ PARA O MOMENTO

Isolo-me na madrugada.
Deixem-me, 
quero escrever umas linhas.
(Umas linhas para que não me queiram deixar...)

E do que me queixo, 
mão no queixo,
se não é nada do que estou pensando?
(Sou o contrário, mesmo me opondo...)

O que sou é contrafluxo, 
maré em reverso.
Deixe-me ser, 
mas não me deixe estar

só para o momento.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

NANO

Os mais belos poemas,
dos melhores poetas,
estão escritos!
Temos licença pra ser pequenos!

Para nos apequenar aquém daqueles,
menores do que quando foram mínimos,
quando havia ainda a mínima grandeza.

Estamos livres para conspurcar a página,
dotá-la de nódoas tristes,
tristes das nossas agruras
nada revelarem que se some à dor dos homens.

Porque os homens são tantos, e são tudo,
e se agrupam no universal.
E nós não nos destacamos;
singulares, somos mesmo quaisquer.

Abandono, 
dono sem bando.
Do contrário, o contrabando
do que se dá sem ser recebido.

E vamos anotar no vento
o que logo que esculpido se diluirá.
Porque somos indefinidos e disso
nem a morte nos redimirá.

Somos indefinidos e nada esperamos,
nem restamos eterno esperar.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

PASSAGEIRO

As mulheres têm um encanto inaudito,
que vai além dos traços bonitos.
E quem não vê está em conflito,
e não verá nenhum deus o ajudar.

Sinto uma devoção pelo feminino
(sinto-a desde menino!)
de que há alguma testemunha,
e não é preciso mais de uma
para a minha fé se concentrar.

Nisso estou ao abrigo do tempo,
nisso sou meu próprio detento,
e ainda na paz eu irei tropeçar.

Mas humano, demasiado humano,
às vezes acho que sou como o ano,
que nada sabe (nem fazer planos),
nada sabe além de passar.