sexta-feira, 10 de maio de 2019

TREM SÓ TRILHOS

(pour Vincent et Fernando António)


Olhos azuis.
Olhos castanhos.
Olhos assados, assim.
Olhos sempre tão estranhos
os olhos que olham pra mim.

De cima abaixo.
De baixo pra cima.
De fora pra dentro,
através.
Só não encontro olhos tão doces
que me livrem deste revés.

Ou deste convés
de navegar a solidão.
Onde existem solitários
de sorriso sempre à mão?

Sorriso sempre no rosto!
(A alegria, mesmo se ausente,
sempre encontra algum preposto).

Solitários nos departamentos,
solitários na prisão.
Solitários impercebidos
ganham a densa multidão.

Mas a multidão não pensa,
não trem crivo,
não nota!

A multidão dos esquivos,
do egoísmo,
dos janotas.

Levo-me pra passear
e vejo fora o de dentro.
Ou estou-me tão dentro
que me perco na metáfora.

O essencial é um passo pedir outro,
nem sempre no mesmo sentido.
Poder recalcular a rota,
e Deus sempre comigo.

Porque esse silêncio todo,
sem barulho que o disfarce,
é sua voz cariciosa
que, creio, não terá nunca face.

Nem barbas brancas,
nem valor de superfície.
Deus é o responsável mais remoto
por toda minha maluquice.

Que o livre-arbítrio,
coisa doida,
ora é âncora, 
ora vela.

E agora me despeço ocupado
por mais um dia na Terra.

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