O amargo para saber do doce,
o doce para saber do amargo.
Quem já não o tivesse sentido
poderia achar que eu tinha inventado.
O amargo para saber do doce,
o doce para saber do amargo.
Quem já não o tivesse sentido
poderia achar que eu tinha inventado.
Ninguém foge aos conselhos da madrugada,
despertos ou adormecidos.
Os conselhos da madrugada têm algo de intrometidos.
(Ainda para os abstêmios é como se houvessem bebido)
Nada parece pequeno, tudo se vê expandido.
Qualquer decisão que se avente parece selar o destino.
Mas o dia raia sobre a loucura como raia sobre o siso.
E sempre trará o querer ter ou não ter cometido.
A conversa mais transcendente que se pode entreter
numa quarta-feira de cinzas é com divorciados.
Sabem que a ressurreição existe.
Tiveram a coragem de desfilar.
Enfrentaram o rigor milimétrico da apuração.
E recolheram-se, muitos, sem nem faixa de campeão.
Às vezes a euforia dura quatro dias por ano,
às vezes quatro anos
(às vezes é só enfermidade).
Mas transcendem.
Mesmo se o carnaval não foi uma escolha tão consciente.
Era bloco pra todo lado, aderir a um ou ser arrastado.
E tomem serpentinas e buquês e muitos figurantes,
de abadá ou "enternados".
Depois que passa parece um sonho,
ou talvez até pesadelo.
Não sabem se "nunca mais!"
ou "nos vemos em fevereiro!"
As madrugadas dos feriados parecem blindadas
contra até a passagem do tempo.
E têm um fermento distinto,
como se delas pudessem nascer poemas,
problemas, vergonhas ou projetos vitoriosos.
Mas madrugadas é que são os tempos faustosos!
Nada me alcança.
Nada me atormenta.
A campainha não soa.
A companhia repousa.
O mundo está onde pertencente: lá.
E mesmo lá posso buscá-lo, num passo,
como me convenha.
Ser criador é uma ótima ideia,
embora seja velha.
É um poder irresistível;
os personagens nascem e morrem
(conforme saiam dos trilhos).
Criar é liberdade,
e liberdade, um perigo!
Então deponho a caneta
(como ora convém ao livre-arbítrio)
É uma vela que por mais que se sopra
não se apaga.
Porque de um velório sem morta
ou de festa sem a convidada.
Não se apaga e se não se apaga
não se realizam os desejos.
(Talvez porque sejam os ecos
de já tão apagados festejos).
Alegrias em que... ainda se vive?
Resta a questão filosófica pura:
a espera é sobrevida
ou é morte prematura?
A página completamente branca
é o infinito das possiblidades.
E precisar de pauta ou formulário,
um diagnóstico de banalidade.